Teatro da Vertigem - breve histórico de uma intensa trajetória

Por Cleber Lima

O Teatro da Vertigem iniciou suas atividades em 1991, quando Antônio Araújo  reúne-se a um grupo de colegas atores recém formados na Escola de Comunicações e Artes da USP: Daniela Nefussi, Johana Albuquerque, Lúcia Romano e Vanderlei Bernardino. O grupo mergulha num processo de pesquisa experimental direcionado à aplicação de princípios da Mecânica Clássica ao movimento expressivo do ator.
 
 
O processo resultou no primeiro espetáculo do grupo “O Paraíso Perdido”  , que ficou em cartaz durante oito meses em 1992, ano de sua estreia, na Igreja de Santa Ifigênia  em São Paulo. A montagem é inspirada livremente no poema barroco de John Milton e levada a cabo por meio de um processo colaborativo onde atores, dramaturgo e encenador refletem sobre o(s) sentido(s) do sagrado.
 
A utilização de espaços não convencionais à linguagem teatral mostra-se como uma forte vertente de pesquisa para o grupo. Assim, o processo de montagem volta-se à apropriação cênica de um novo espaço: o Hospital Humberto PrimoŸ. O trabalho de pesquisa, experimentação e dramaturgia volta-se para as fragilidades da condição humana, tendo como pretexto o texto bíblico “O Livro de Jó” , que dá nome ao novo espetáculo com estreia em 1995.
 
 
A próxima montagem contribuiu para o aprofundamento e afirmação do processo colaborativo como proposta de trabalho do grupo. Buscando inspiração no texto bíblico “Apocalipse” de São João, o grupo empreende uma incursão nas misérias humanas, expondo as feridas presentes na tessitura social da época. O processo de pesquisa e criação colaborativa resultará na estreia de “Apocalipse 1, 11”, em 2000, no antigo Presídio do Hipódromo, na cidade de São Paulo. Com a realização deste terceiro espetáculo com vínculos significativos a temáticas religiosas, naturalmente passou-se a utilizar a denominação de Trilogia Bíblica para as três primeiras montagens do grupo, e que foi apresentada em 2002 como parte das comemorações aos dez anos de existência do coletivo.
 
             Em 2004 têm início as investigações para a próxima montagem. O grupo instala uma sede provisória no bairro de Brasilândia, periferia de São Paulo, onde passa a desenvolver uma série de atividades culturais e pedagógicas, além do reconhecimento da realidade local. Neste mesmo ano, o grupo viaja para Brasília (DF) e Brasiléia (AC), como parte da pesquisa de campo para o próximo projeto. Todo o material coletado e as experiências vivenciadas durante a residência artística em Brasiléia e a viagem para as outras duas cidades foram utilizados em experimentos, improvisações e workshops que resultaram no espetáculo "BR-3", estreando em 2006. Seguindo a linguagem de pesquisa adotada pelo grupo, um novo espaço é proposto, e de forma inédita, o grupo ocupa parte do Rio Tietê, na cidade de São Paulo, onde o público assiste à montagem a bordo de uma embarcação que o desloca em um trecho de aproximadamente 14 km de trecho urbano do rio.
 
 
            Com o espetáculo “História de Amor”, de 2007, o grupo realiza uma pesquisa sobre a palavra e as possibilidades investigativas dos processos de interpretação. A montagem ficou em cartaz no Teatro Cacilda Becker, no Teatro João Caetano e no TUSP, todos na cidade de São Paulo, entre outros, sendo o primeiro trabalho do grupo utilizando o espaço cênico convencional, ou seja, o palco. Após o retorno de Santiago, no Chile, onde apresentaram “O Livro de Jó” em 2008, o grupo participa de um projeto de intercâmbio artístico com o LOT de Lima (Peru) e o Zikzira de Belo Horizonte (MG). O projeto resulta na intervenção artística “A Última Palavra é a Penúltima” criada a partir de estudos sobre o texto “O Esgotado” de Gilles Deleuze. Mais uma vez o espaço escolhido é não convencional, neste caso, a passagem subterrânea da Rua Xavier de Toledo, no centro da cidade de São Paulo. Neste mesmo ano, o grupo estreia “Dido e Enéas”de Henry Purcell, a primeira ópera montada pelo coletivo, com a participação do Coral Paulistano. A exemplo das principais montagens do grupo, a ópera deixa o palco barroco do Teatro Municipal de São Paulo e é incorporada aos elementos do novo espaço de produção de cenários e figurinos do Municipal no Canindé, Zona Norte de São Paulo. Movidos pelos estudos filosóficos empreendidos anteriormente, o grupo pesquisa “O castelo”de Franz Kafka, resultando no espetáculo “Kastelo”, que reflete sobre os mecanismos da sociedade do trabalho e da sociedade de controle. O espetáculo estreia em 2010, no prédio do SESC, na Avenida Paulista, em São Paulo. O público assistia ao espetáculo através das vidraças do prédio, enquanto os atores se apresentavam sobre andaimes no lado de fora.
 
            O último projeto do grupo teve início em 2010 e estreou em junho de 2012. Está centrado na discussão sobre temas que levantam aspectos relacionais entre arte e cidade, sendo que a pesquisa de campo ocorreu no Bairro do Bom Retiro, na capital paulistana. Em 2011 o projeto passou para a etapa da pesquisa in loco, tendo como parceira a Oficina Cultural Oswald de Andrade. Segundo o autor, Joca Reiners Terron, o espetáculo “Bom Retiro 958 metros” aborda fetiches por manequins, lixo, roupas e outros objetos que criam vida nos 958 metros percorridos pelo público dentro do Lombroso Fashion Mall, antigo shopping do bairro especializado em lojas de roupas, nas ruas do entorno e no antigo Teatro Taib, dentro do Instituto Cultural Israelita Brasileiro, no bairro do Bom Retiro.
 
    Considerando o percurso do grupo e suas principais montagens, identificamos princípios e procedimentos que o circunscreve no contexto do teatro pós-dramático, na medida em que podemos identificar em seus processos de criação e no resultado estético, elementos como a presença do performer; a hibridização através da mistura de linguagens (teatro, artes plásticas, vídeo, dança, música, performance); a polifonia das diversas “vozes” atuantes na dramaturgia e na encenação levando à uma autoria compartilhada da obra; a simultaneidade de imagens, cenas e estímulos; a prática do site specific por meio da apropriação de espaços não convencionais ao teatro; culminando em espetáculos com forte carga semântica, provocativos, inquietantes, onde os estados estimulados no público são potencializados. Isto não exclui é claro, a influência e o uso de determinados princípios e procedimentos do teatro dramático, de registro mais naturalista, como a realização de laboratórios durante a pesquisa de campo, buscando conhecer e apropriar-se de contextos e personagens alheios ao campo vivencial dos atores; ou do teatro épico e sua dimensão didática e política, através do empego do estranhamento, distanciando o público da identificação emocional, proporcionando-lhe assim a oportunidade de ampliar sua reflexão sobre o que vê. 
 

 

Após o estudo do hipertexto didático sobre o histórico do grupo e suas produções, registre aqui os princípios e procedimentos de criação que você identifica nas montagens do Teatro da Vertigem e comente-os.

Princípios e Procedimentos

Sabine R. | 17/07/2013

Notei como o princípio o site specific.
Como procedimentos: vivência; workshop e processo colaborativo.

Principios e procedimentos

Raphael da Silva Miranda | 17/07/2013

Princípio: Cenografia, dramaturgia visual
Procedimentos: Corporeidade, musicalização, Imagem de Sonho; A busca de uma encenação onde o texto não está necessariamente no foco, a busca de outras formas de expressão que não o texto, sejam elas de forma corporal, luz ou musical, o texto entra como mais um elemento da prática cênica.

Princípio: Teatro de Composição Cênica dinâmica
Procedimentos Corporeidade, Imagem de Sonho, a oscilação da composição cênica, não e estático. Simultaneidade da encenação


Princípio: Teatro de Estados
Procedimentos a busca de um teatro sinestésico, de sentidos, frio Calor

Principio Percepção aberta e fragmentada
Procedimento Mais manifestação do que significado, imagem de sonho, colagem montagem e fragmentada, Estrutura parciais e não totais, Sacrifício da Síntese, por meio deste procedimentos, busca-se uma percepção diferenciada da encenação em que cada momento de encenação possa representar toda a construção de uma ou mais historias
Principio irrupção do real
Procedimentos Corporeidade, imagens fortes e impactantes, mais presença do que representação, experiência compartilhada; a busca de um teatro em que as impressões sensoriais não deixarão o espectador fazer a divisão entre o real e fictício

Princípios e procedimentos

Eliane Belmonte Lucenti | 15/07/2013

Meus queridos colegas de palco, Magno,Gabriel e Gustavo(adorei sua exposição, organizada e clara) basicamente explanaram todos os princípios/procedimentos os quais pude observar, mas os que mais me chamaram a atenção foram:

- CORPOREIDADE
Logo no primeiro contato que tive com o grupo uma das primeiras coisas que pensei foi: "Nossa deve ter um trabalho corporal muito ferrado por trás disso tudo" . Depois com o aprofundamento dos estudos sobre o grupo vi que de fato existia todo um trabalho voltado ao movimento, a essa expressividade corporal, assim podendo elucidar e racionalizar o que de forma inconsciente havia me chamado a atenção.


- MAIS PRESENÇA DO QUE REPRESENTAÇÃO
Este principio em minha opinião é muito importante e colabora para tornar o espetáculo mais visceral. O ator esta entregue a cena não como um personagem mas como individuo que é, e toma partido pelas experiências reais que teve a partir das vivências que se propôs para a construção do espetáculo.

- MUSICALIZAÇÃO
O som como elemento vivo dentro da cena, agregando valor e individualizando a experiência, deixa de ser somente um plano de fundo.

- SIMULTANEIDADE
Várias "coisas" acontecendo ao mesmo tempo, com nuances diferentes aguçando seus sentidos e percepções. Para alguns uma experiência atordoante, para mim a vontade de assistir novamente para garantir que não perdi nada.


- ESTRUTURAÇÃO PARCIAL
Possibilita trazer à tona diversos temas os quais cabe ao público liga-los. Acho fantástico que cada um possa sair com a sua colcha de retalhos, cheia de significados que costurou ao longo da apresentação.

- TEATRO DE ESTADOS
Sentimentos/ sensações ambíguas, uma verdadeira montanha russa, amor/ódio, tristeza/alegria, calor/frio, repulsa/desejo...é preciso algum tempo para sedimentação de tudo.

Cada espetáculo tem suas peculiaridades e privilegia um ou outro dos itens acima citados, mas em minha opinião todos estiveram, em maior ou menor força, presentes em todos os trabalhos com quais tomei contato.



Princípios e procedimentos

Gustavo Vieira | 14/07/2013

PRINCÍPIOS E PROCEDIMENTOS INDIVIDUAIS, PRÉ CONSTRUÇÃO.

Princípio: PESQUISA DE CAMPO
Procedimento: Registrar (fotografar, desenhar, topografar local, histórias das pessoas do local.

Princípio: VIVÊNCIA
Procedimento: Onde o registro é a percepção do pesquisador , vivência concreta "in loco".
Visitas em geral, ex: aulas de anatomia, IML, etc.

Princípio: OBSERVAÇÃO ATIVA
Procedimento: Não atento apenas ao espaço, mas também aos movimentos.
Percepção dos 5 sentidos.
Objetividade: Penetrar atentamente nos detalhes, descobrir a causa, refletir o que há por traz das coisas.

Princípio: IMPARCIALIDADE
Procedimento:o não julgar previamente, libertando-se das ideias pré concebidas, estar neutro.
Procurar estabelecer as relações internas dos fatos.
Dialogar com os fatos.
Usar a máxima suspeita por si mesmo. "Sendo perfeito na pesquisa, sem se contentar com o pouco".

PRINCÍPIOS E PROCEDIMENTOS PARA AS "AÇÕES" DO ESPETÁCULO:

Princípio: DEPOIMENTO PESSOAL
Procedimentos: Visão pessoal e o posicionamento crítico: emitir uma opinião, crítica, impressão.
Além do viés crítico, o ator recorreria a sua história pessoal para realização de cenas e workshops, que colaboram na construção coletiva do espetáculo.
Não funciona apenas como instrumento de pesquisa, no caso: temática, mas também como gerador do material bruto.

PRINCÍPIOS E PROCEDIMENTOS NO ESPETÁCULO:

Princípio: TEATRO DE ESTADOS
Procedimento: um teatro que nos faz sentir não apenas um sentimento, emoção, ou estado em si, mas sim diversos, calor/frio, amor/ódio, felicidade/tristeza...

Princípio: SIMULTANEIDADE
Procedimento: em um certo momento do espetáculo é possível identificar vários acontecimentos, várias cenas num só momento.

Princípio: CENOGRAFIA, DRAMATURGIA VISUAL
Procedimentos: Uma dramaturgia corporal, não uma dramaturgia de texto, onde se diz mais com o corpo, movimentos, olhares.

Princípio: IRRUPÇÃO DO REAL
Procedimentos: Colocar a realidade, e não algo fictício como o teatro tradicional, deixando-o assim mais visceral.

Princípio: CORPOREIDADE
Procedimento: o corpo passa a ocupar o ponto central não como portador de sentido, mas em sua substância física e gesticulação.

Principio: Musicalização
Procedimento: Desenvolve-se uma semiótica auditiva própria.

Princípio: MAIS MANIFESTAÇÃO DO QUE SIGNIFICADO
Procedimento: Não é dado ao público nenhuma explicação, mas sim performances, diálogos, imagens que o faz PENSAR.

Princípio:MONTAGEM, COLAGEM E FRAGMENTO
Procedimento: Não se trata de uma única ideia tratada no espetáculo, mas sim diversas, uma colcha de retalhos.

Princípio:MAIS EXPERIENCIA COMPARTILHADA DO QUE COMUNICADA
Procedimento: O público nota esse compartilhamento pois tudo que é feito no espetáculo, não é observado apenas, e sim vivido, por ser tão visceral, tão próximo e direto com o público. Se sente o calor, o frio, a água, o medo, não penas assistem.

Principios e Procedimentos

Gabriel Lima | 13/07/2013

De modo geral, pude identificar nas montagens do grupo Vertigem os seguintes princípios e/ou procedimentos:

• Percepção aberta e fragmentada
• Frieza e calor
• Mais presença do que representação
• Estruturas parciais e não totais
• Colagem, montagem e fragmento
• Mais experiência compartilhada do que comunicada
• Dramaturgia visual
• Mais manifestação do que significado
• Musicalização

Tomo como nota que, apesar da identificação listada acima, em determinadas montagens alguns (princípios e/ou procedimentos) ganham mais força do que outros. E ainda passível de analise, de modo particular, observo que, as primeiras montagens (principalmente as que compõem a Trilogia Bíblica) são as que possuem maior presença das características relatadas aqui.

Principios e Procedimentos

Magno | 11/07/2013

Principio: espaços não convencionais, pois através dela o teatro busca se interagir mais com a plateia,fazendo transparecer uma realidade e vivacidade ainda maior ao espetáculo. Procedimentos: Pesquisa de campo e processo colaborativo,através dela o grupo tenta intensificar o grau de participação (interação) com o público tornando-o assim mais realista, o que acaba por fazer com que os espectadores participem mesmo não querendo de forma direta ou indireta da encenação.

Orientações metodológicas

Cleber Lima | 11/07/2013

Conforme discutimos presencialmente, considere princípios como o conjunto de preceitos, pressupostos, posicionamentos que norteiam as escolhas estéticas da encenação, e procedimentos de criação, os métodos e formas de execução e concretização das proposições para a cena. Princípio seria a “maneira de se pensar” sobre algo, um posicionamento sobre algum tema ou ideia, já os procedimentos de criação são os modos/maneiras/técnicas que são realizadas para a construção do espetáculo.

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