Ator

 

1. Corpo Condutor

O ator, desempenhando um papel ou encarnando uma personagem*, situa-se no próprio cerne do acontecimento teatral. Ele é o vínculo vivo entre o texto do autor, as diretivas de atuação do encenador e o olhar e a audição do espectador. Compreende-se que este papel esmagador tenha feito dele, na história do teatro, ora uma personagem adulada e mitificada, um "monstro sagrado", ora um ser desprezado do qual a sociedade desconfia por um medo quase instintivo.

 

2. Distância e Proximidade

Até o início do século VII, o termo ator* designava a personagem da peça; ele passou a ser, em seguida, aquele que tem um papel, o artesão da cena e o comediante*. Na tradição ocidental, na qual o ator encarna sua personagem, fazendo-se passar por ela, ele é, antes de mais nada, uma presença física em cena, mantendo verdadeiras relações de "corpo a corpo" com o público, o qual é convidado a sentir o lado imediatamente palpável e carnal, mas também efêmero e impalpável de sua aparição. O ator, ouve-se dizer com frequência, é como que "habitado" e metamorfoseado por uma outra pessoa; não é mais ele mesmo, e sim uma força que o leva a agir sob os traços de um outro: mito romântico do ator de "direito divino", que não estabelece mais diferença entre o palco e a vida. Contudo, este é apenas um dos possíveis aspectos do vínculo entre ator e personagem: ele pode marcar também toda a distância que o separa do seu papel mostrando, como o ator brechtiano, sua construção artificial. Esta é uma velhíssima discussão entre os partidários de um ator "sincero" que sente e revive todas as emoções da personagem e um ator capaz de dominá-las e simulá-las, "fantoche maravilhoso cujos fios o poeta puxa e ao qual ele indica a cada linha a verdadeira forma que ele deve assumir" (DIDEROT, em Paradoxo Sobre o Comediante, 1775). A questão da sinceridade do ator assume às vezes a forma de um conflito entre duas concepções de criatividade no ator: ator/rei que improvisa e cria livremente, às vezes com os excessos do canastrão ou do "monstro sagrado", ou o ator considerado como supermarionete* (CRAIG) acionado por um encenador.

 

3. A Formação do Ator

Durante muito tempo inexistente ou abandonada ao aprendizado de técnicas próprias de uma certa tradição, a formação do ator acompanhou o movimento de sistematização do trabalho de encenação; ela visa desenvolver o indivíduo global: voz, corpo, intelecto, sensibilidade, reflexão sobre a dramaturgia e o papel social do teatro. O ator contemporâneo deixou definitivamente para trás os dilemas e mitos do ator-senhor ou do ator-escravo; ele aspira a representar o papel modesto porém exaltante de um intérprete, não mais de uma simples personagem, mas do texto e de sua encenação.

 

4. Enunciador

O ator é sempre um intérprete e um enunciador do texto ou da ação: é, ao mesmo tempo, aquele que é significado pelo texto (cujo papel é uma construção metódica a partir de uma leitura) e aquele que faz significar o texto de uma maneira nova a cada interpretação. A ação mimética permite ao ator parecer inventar uma fala e uma ação que na verdade lhe foram ditadas por um texto, um roteiro, um estilo de representação ou de improvisação. Ele joga com esta fala que ele emite instalando-a de acordo com o dispositivo de sentido da encenação e interpelando o espectador (através de seus interlocutores) sem, contudo, dar-lhe o direito de resposta. Simula uma ação, fazendo-se passar por seu protagonista pertencente a um universo fictício. Ao mesmo tempo, realiza ações cênicas e continua a ser ele próprio, qualquer que seja o que ele possa sugerir. A duplicidade: viver e mostrar, ser ele mesmo e outro, um ser de papel e um ser de carne e osso, tal é a marca fascinante do seu emprego.

 

5. Ator, Produtor e Produto

Para além de todas estas manobras enganosas, o ator é um portador de signos, um cruzamento de informações sobre a história contada (seu lugar no universo da ficção), sobre a caracterização psicológica e gestual das personagens, sobre a relação com o espaço cênico ou o desenrolar da representação. Perde então sua aura misteriosa em benefício de um processo de significação e de uma integração ao espetáculo global. Mesmo que sua função na representação pareça relativa e substituível (por um objeto, um cenário, uma voz ou uma máquina de interpretar), continua a ser a aposta de todas as práticas teatrais e de todos os movimentos estéticos desde o surgimento da encenação. Compreende seu papel como o de um dos artesãos do espetáculo e em função da tarefa pedagógica e política do teatro. Com frequência renunciou a enganar o seu mundo ao não pretender mais improvisar sem esforço. Tanto quanto sua "naturalidade", o que nos interessa agora é realmente o trabalho do ator, sua técnica corporal e seus exercícios respiratórios.

 

Fonte:

PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. Trad. J. Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. São Paulo: Perspectiva, 1999. Pág. 30-1