Encenador

 

Pessoa encarregada de montar uma peça, assumindo a responsabilidade estética e organizacional do espetáculo, escolhendo os atores, interpretando o texto, utilizando as possibilidades cênicas à sua disposição.

1. O surgimento da função e do termo geralmente é situado na primeira metade do século XIX. Se a palavra e a prática sistemática da encenação* datam desta época, não faltam ancestrais mais ou menos legítimos do encenador na história do teatro (cf VEINSTEIN, 1955: 116-191).

 

2. No teatro grego, o didascalo (de didaskalos, instrutor) era às vezes o próprio autor: ele cumpria a função de organizador. Na Idade Média, o meneur de jeu "condutor do jogo" tinha a responsabilidade ao mesmo tempo ideológica e estética dos mistérios. Na época do Renascimento e do barroco, muitas vezes é o arquiteto ou o cenógrafo que organiza o espetáculo de acordo com sua própria perspectiva. No século XVIII, passa-se o bastão a grandes atores: IFFLAND, SCHRODER serão, na Alemanha, os primeiros grandes "ensaiadores". Mas será preciso esperar o naturalismo - em particular o duque Jorge II DE MEININGEN, A. ANTOINE e K. STANISLÁVSKI - para que a função se tome uma disciplina e uma arte em si.

 

3. É delicado estabelecer um estatuto definitivo sobre a oportunidade e a importância do encenador na criação teatral, pois, em última análise, os argumentos sempre se reduzem a uma questão de gosto e de ideologia e não a uma discussão estética objetiva. Constatar-se-á simplesmente que o encenador existe e que se faz sentir - particularmente, aliás, quando não está à altura de sua tarefa - na produção cênica. Durante os anos sessenta e setenta, ele se viu periodicamente contestado por outros "colegas": o ator que se sente aprisionado por diretivas demasiado tirânicas; o cenógrafo que gostaria de prender na armadilha de sua máquina de representar a equipe artística e o público; o "coletivo" que recusa as distinções no grupo ao encarregar-se do espetáculo e propõe uma criação coletiva*; e, chegando por último, o animador* cultural que serve de intermediário entre a arte e sua comercialização, entre os artistas e a cidade: posição desconfortável, porém estratégica.

 

4. Nos anos noventa, a função do encenador quase não é mais contestada, porém é consideravelmente banalizada. A questão não é mais saber se o encenador faz demais ou não faz o suficiente - se é um mestre ou um medidor -, se a encenação é uma "demasiadação" (VINAVER, 1988); faz-se antes, com VINAVER, "a aposta de um retomo para mais modéstia e leveza, para menos arte e mais artesanato" (VINAVER in FLOECK, 1989: 254). Sem dúvida, ainda se encontra a afirmação, mais tortuosa que ingênua, de que a melhor encenação deve contentar-se em deixar o texto falar (S. SEIDE, C. RÉGY, P. CHÉREAU, J. LASSALLE, citados in L'Art du Théâtre, n. 6, 1986). M. DURAS exige da encenação que ela faça o menos possível: "A representação rouba o texto, nada traz a ele, pelo contrário, rouba a presença do texto, profundidade, músculos, sangue" ("Le théâtre", in: La Vie Matérielle). A jovem geração de encenadores não é mais tributária de um modelo desconstrutor, seja ele a psicanálise, o marxismo ou a linguística, ela não mais se refere a modelos ou escolas, e menos ainda a movimentos ou "-ismos"; ela progride a cada trabalho, sem um programa definido, por vezes sem as asas protetoras da instituição. Certos artistas passam da encenação à escritura (A. HAKIM, H. COLAS, C. ANNE, P. RAMBERT, Ph. MINYANA, J. JOUANNEAU, D. LEMAHIEU, A. BÉZU, J.-F. PEYRET, J. ROUSSEAU), outros conservam a lembrança de sua educação "formal" com VITEZ (B. JAQUES, c. SCHIAREM, S. LOUCASHEVSKY, S. BRAUNSCHWEIG, J. DANAN), alguns se abrem para a produção intercultural (C. VÉRICEL, G. TSAI, X. DURRINGER, M. NAKACHE, X. MARCHESCHI, E. SOLA), alguns se distinguem por uma nova relação com o texto concebido como material plástico (E. DA SILVA, O. PY) ou material de resistência (S. NORDEY, P. PRADINAS, C. ALLOUCHERIE, E. LACASCADE).

 

Fonte:

PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. Trad. J. Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. São Paulo: Perspectiva, 1999. Pág. 128